domingo, 28 de junho de 2009

A Teologia de John Wesley a um Fio

O entendimento de John Wesley (1703-1791) (um dos grandes evangelistas do Grande Avivamento do século 18), sobre a obra da salvação era basicamente arminiano, embora só no fim da vida ele se interessou pelos escritos do teólogo holandês Jacobus Arminius. Ainda que Wesley cresse na doutrina do pecado original e na depravação e incapacidade do pecador em responder à graça, ele cria que Deus escolheria pecadores por prever quem teria fé em Cristo, que morreu por todos os homens. E que o cristão que permanecer em pecado grosseiro pode perder a salvação.

Sua teologia foi uma síntese entre a piedade sacramental anglicana, os escritos devocionais dos pais orientais, o misticismo católico medieval, a teologia prática puritana e a ênfase evangelística dos morávios, fundidos com os temas principais da tradição da Reforma, que estavam presentes em seus sermões.
[...]
Ainda que em aspectos importantes se tenha afastado da tradição luterana e reformada, John Wesley reconheceu, em 1745, que sua teologia estava “a um fio de cabelo” do pensamento de João Calvino: “Ao atribuir todo o bem à livre graça de Deus. Ao negar o livre-arbítrio natural e o poder antecedente à graça. E, ao excluir o mérito humano; mesmo para o que ele realizou ou pratica pela graça de Deus”. Isso é exemplificado numa conversa que Charles Simeon, ministro da Holy Trinity Church, em Cambridge, teve com Wesley, em 1784:

Senhor, sei que o chamam de arminiano, e algumas vezes sou chamado de calvinista; portanto, deveríamos desembainhar as espadas. Porém, antes de consentir em iniciar o combate, permita-me fazer-lhe algumas perguntas [...] Diga-me: o senhor se sente uma criatura depravada, tão depravada que nunca teria pensando em voltar-se para Deus, se ele não tivesse coloca isso em seu coração?

Sim [replicou o veterano], sinto-o realmente.

E não tem esperança alguma de tornar-se aceitável perante Deus por qualquer coisa que possa fazer por si; e espera na salvação exclusivamente através do sangue e da justiça de Cristo?

Sim, unicamente por meio de Cristo.

Mas, senhor, supondo-se que foi inicialmente salvo por Cristo, não poderia de alguma outra forma salvar-se depois, através de suas próprias obras?

Não, mas terei de ser salvo por Cristo do princípio ao fim.

Admitindo, portanto, que foi inicialmente convertido pela graça de Deus, o senhor, de um modo ou de outro não tem que se manter por suas próprias forças?

Não.

Nesse caso, então, o senhor tem que ser mantido, cada hora e momento, por Deus, tal como uma criança nos braços de sua mãe?

Sim, inteiramente.

E toda sua esperança está firmada na graça e misericórdia de Deus, para ser preservado até o seu reino celeste?

Sim, não tenho esperanças senão nele.

Então, senhor, com sua permissão embainharei novamente a minha espada; pois este é todo o meu calvinismo, esta é a minha eleição, minha justificação pela fé, minha perseverança final; em suma, é tudo quanto sustento, e como o sustento; portanto, se lhe parecer bem, em lugar de buscarmos termos e frases que serviriam de base para luta entre nós, unamo-nos cordialmente naquelas coisas sobre as quais concordamos.


Extraído do livro “Gigantes da Fé”, de Franklin Ferreira, editora Vida, pg. 236-239. 2006.

quarta-feira, 24 de junho de 2009

Sobre os Dinossauros - Adauto Lourenço

Parte 1: as propostas criacionistas, etmologia, a idéia de concepção artística e informações gerais sobre os dinossauros.

Parte 2: + informações gerais, a teoria evolucionista confrontada, evidências do registro fóssil e da arqueologia sobre a coexistência dos dinossauros com seres humanos,

Parte 3: evidência do registro histórico, dragões existiram?, em 1925-achado de uma cabeça, 1977- achado de uma carcaça,

Parte 4: o Mokele Mbembe, dificuldades para a pesquisa e busca dos dinossauros, um problema teológico muito sério, algumas passagens bíblicas analisadas, conclusões

Parte 5: a nossa atitude em relação a atitude dos bereianos (At 17.11)

domingo, 21 de junho de 2009

Você Serve ao Senhor com Alegria?

Servi ao Senhor com alegria
Sl 100.2


Satisfação no servir a Deus é uma evidência de nossa aceitação. Aqueles que O servem com um semblante tristonho, porque estão fazendo alguma coisa que é desagradável para si mesmos, não O estão servindo de maneira alguma. Eles apresentam uma forma de reverência, mas a vida espiritual encontra-se ausente. Nosso Deus não exige a presença de escravos para embelezar seu trono. Ele é o Senhor de um reino de amor e deseja que seus servos estejam vestidos com vestes de alegria. Os anjos de Deus O servem com cânticos e não com murmurações. Uma murmuração ou um lamento seria uma rebelião nas hostes angelicais. A obediência involuntária equivale a desobediência. O Senhor olha para o coração; e, se Ele vê que O servimos por obrigação e não porque O amamos, Ele rejeitará nossa adoração. Se retirarmos a alegre espontaneidade do crente, teremos removido o teste de sua sinceridade.

Se um homem tem de ser levado forçosamente à batalha ele não é um patriota. Aquele, porém, que marcha para a guerra com feição radiante, cantando: "É agradável morrer pela pátria", comprova que é sincero em seu patriotismo. O regozijo é o sustentáculo de nosso vigor. Na alegria do Senhor, nós somos fortes; ela age como um instrumento de remoção das dificuldades. A alegria do Senhor é para o nosso culto aquilo que o óleo é para as rodas de um veículo. Sem óleo, o eixo logo se torna aquecido e acontecem acidentes. Se não houver um regozijo santo para lubrificar nossas rodas, nosso espírito ficará travado com fadiga. O homem que se regozija no serviço de Deus prova que a obediência é a sua vida. Você serve ao Senhor com alegria? Mostremos às pessoas do mundo, as quais pensam que nosso cristianismo é uma servidão, que para nós o cristianismo é um deleite e um regozijo. Deixemos que a nossa alegria demonstre que servimos um excelente Senhor.

C. H. Spurgeon

quarta-feira, 17 de junho de 2009

Desabafo

Talvez eu esteja errado ou talvez eu esteja certo em pensar que a nossa geração de adolescentes e jovens não tem tempo (se tem tempo, não tem vontade) para assumir compromissos com Deus ou com a igreja onde professam a sua fé.

Recentemente conversava com um pastor e desabafava dizendo que as coisas estão muito difíceis. Os jovens, de maneira geral, não respondem mais as verdades das Escrituras, são insensíveis as doutrinas, vivem de qualquer jeito, são alienados. Conhecem mais as letras das músicas da Ivete Sangalo do que as letras da Bíblia. São superficiais quando o assunto é Deus. Muitos nasceram na igreja e não sabem dizer nem se quer quais as duas doutrinas que um cristão necessita conhecer e viver para ser salvo! São muitos os podres, muitas as intrigas e falta de comunhão e não seria um mal resumo dizer: “Eles buscam a Deus em terceiro lugar”. Há ainda extremos terríveis. Já ouvi da boca de um “irmão” que ele não é convertido e que se batizou e toma a ceia do Senhor porque o seu pai o força! Ou seja, não é somente culpa da espiritualidade dos jovens. O problema é mais complicado, o buraco é mais fundo do que eu imagino, se eu não estiver errado. Esse pastor me dizia que por onde ele tem passado, essa tem sido a realidade nas mocidades das igrejas históricas.

Tenho visto na minha experiência um quadro negativo. Não consigo dizer: “Nossos jovens são fortes”. Já me questionei algumas vezes se estou sendo duro ou exigente de mais. Encontro pessoas que me dizem que sou exatamente assim. Mas quando leio os profetas (Isaías, Jeremias, Ezequiel, Malaquias...), quando leio o sermão de Jesus em Mt 5-7 ou quando medito nas cartas de Paulo, não percebo que a Bíblia exorta no sistema “rédeas frouxas e vistas grossas”. O padrão é alto de mais para todos. Mas graças a Deus pelas Suas misericórdias e pela Sua Palavra que assim nos diz: “Se confessarmos os nossos pecados, ele é fiel e justo para nos perdoar os pecados e nos purificar de toda injustiça” (1Jo 1.9). Acontece que estamos mais para o versículo 10 do que para versículo 9 de 1Jo 1: “Se dissermos que não temos cometido pecado, fazemo-lo mentiroso, e a sua palavra não está em nós.” Será que estou sendo injusto? Será que o desânimo está me dominando? Será?

Em determinado momento, disse ao pastor: “Acho que Deus está segurando a mão dEle para que venha o atormentador dia da apostasia final (2Ts 2.3, Mt 24.21)”. A Bíblia fala que Deus abomina a teologia da prosperidade (Mt 6.21,24,25), abomina uma vida que não O prioriza, relaxada com a Sua obra (Ag 1.4, Jr 48.10), abomina os falsos apóstolos e profetas (Jr 23, 2Co 11.4,5), abomina as tradições (Mt 15), abomina os relacionamentos mistos (Gn 6.2,3, Ed 9.1-3, 2Co 6.12-16)... no entanto, tenho a sensação que Deus está somente observando essas coisas acontecerem. Sei que Deus é soberano, sabe perfeitamente quando agir. Não estou apressando o Senhor. Antes, sendo eu um amilenista na escatologia, tento entender as coisas ao meu redor na perspectiva das Escrituras. Como já disse e novamente repito talvez eu esteja errado e então acontecerá um reavivamento pelo poder de Deus semelhantemente ao Grande Avivamento que aconteceu no século 18 e que varreu toda a Inglaterra, se espalhando para outras regiões do mundo. Mas se não houver um verdadeiro despertamento espiritual da nação brasileira, das famílias, dos líderes, dos jovens, creio que caminhamos a passos largos para dias muito difíceis “e, por se multiplicar a iniqüidade, o amor se esfriará de quase todos” (Mt 24.12) e se tais dias não fossem abreviados “ninguém seria salvo; mas, por causa dos escolhidos, tais dias serão abreviados” (Mt 24.22).

Restaura, SENHOR, a nossa sorte, como as torrentes no Neguebe” (Sl 126.4). Restaura, SENHOR. Amém!

domingo, 14 de junho de 2009

Obs Sobre O Pai Nosso + Frases Sobre Oração

Antes de Jesus nos ensinar a orar, Ele nos ensinou como NÃO orar. Reparem:

"E, quando orardes, NÃO sereis como os hipócritas; porque gostam de orar em pé nas sinagogas e nos cantos das praças, para serem vistos dos homens. Em verdade vos digo que eles já receberam a recompensa.Tu, porém, quando orares, entra no teu quarto e, fechada a porta, orarás a teu Pai, que está em secreto; e teu Pai, que vê em secreto, te recompensará.E, orando, NÃO useis de vãs repetições, como os gentios; porque presumem que pelo seu muito falar serão ouvidos. NÃO vos assemelheis, pois, a eles; porque Deus, o vosso Pai, sabe o de que tendes necessidade, antes que lho peçais.NÃO vos assemelheis, pois, a eles; porque Deus, o vosso Pai, sabe o de que tendes necessidade, antes que lho peçais." (Mt 6.5-8)

Aí, ENTÃO, Jesus ensina o Pai Nosso. Em primeiro lugar vem "Deus". Em segundo lugar vem "nós" (não é "eu").

"Portanto, vós orareis assim:

Pai NOSSO, que estás nos céus, santificado seja o TEU nome;venha o TEU reino; faça-se a TUA vontade, assim na terra como no céu;

o pão NOSSO de cada dia dá-nos hoje;e perdoa-NOS as NOSSAS dívidas, assim como NÓS temos perdoado aos NOSSOS devedores;e não NOS deixes cair em tentação; mas livra-NOS do mal {pois teu é o reino, o poder e a glória para sempre. Amém}!" (Mt 6.9-13)

Agora percebam isto: Jesus termina essa oração no amém, mas não termina o seu ensino sobre oração! Ele começa o versículo 14 com um "porque", ligando a oração aos versículos seguintes:

"...Porque, se perdoardes aos homens as suas ofensas, também vosso Pai celeste vos perdoará;se, porém, não perdoardes aos homens {as suas ofensas}, tampouco vosso Pai vos perdoará as vossas ofensas" (Mt 6.14,15)

Ele retoma o assunto do perdão! Porque será que Jesus fez isso? Pensem bem.

"Percorrei todas as orações que se encontram nas Escrituras, e eu não creio que possais encontrar nelas algo que não esteja incluído na oração do Senhor {Pai Nosso}" (Agostinho)

"Através da oração... instruímo-nos mais a nós mesmos do que a Deus" (Lutero)

"Não oraremos de uma maneira correta a menos que a preocupação por nossa própria salvação e zelo pela glória de Deus sejam inseparavelmente entrelaçados em nosso exercício" (Calvino)

"A fim de orarmos corretamente a Deus, deixemo-nos dirigir por esta regra: não distraiamos nossa mente com esperanças várias e incertas, nem dependamos do auxílio mundano, mas deixemos com Deus a honra de elevar nossos corações a ele em oração sincera e fervorosa" (Calvino)

"O que a oração faz é, por assim dizer encher os pulmões da alma com o oxigênio do Espírito Santo e seu poder" (Lloyd-Jones)

"Sempre é bom, antes de orar, gastar deliberadamente algum tempo lembrando-nos de quem Deus é" (John Stott)

"A oração é a conversa da alma com Deus. Um homem sem oração é necessária e totalmente irreligioso. Não pode haver vida sem atividade. Assim como o corpo está morto quando cessa sua atividade, assim a alma que não se dirige em suas orações a Deus, que vive como se não houvesse Deus, está espiritualmente morta" (Charles Hodge)

"Deus não possui filhos mudos" (A. W. Pink)

... "Quem dera que a nossa oração subisse ao céu nesta manhã: 'Jesus, Mestre, vem lançar Teu olhar perscrutador sobre mim, e julga se estou vivendo para Ti ou não! Conceda-me que eu veja a mim mesmo conforme Tu me vês, a fim de que meus erros sejam corrigidos, e minhas graças nutridas. Senhor, faça com que eu seja realmente aquilo que professo ser; e se ainda não o sou, conveça-me da minha falsa condição, e comece uma obra genuína na minha alma. Se eu sou Teu, e se estou certo aos Teus olhos, conceda-me uma palavra bondosa de segurança para cessar os meus temores, e alegremente me regozijarei em Ti como o Deus da minha salvação' "(Spurgeon)

quarta-feira, 10 de junho de 2009

"Às Voltas Com os Interesses do Pai"

Assim como Jesus, precisamos nos envolver com a obra do Pai. Um escritor anônimo captou a essência da mordomia pastoral diante do Senhor com uma exortação no sentido de que se faça a obra de Deus de acordo com a Palavra:

Apegue-se ao trabalho. Não recue porque o leão ruge; não pare para jogar pedras nos cachorros do diabo; não perca tempo caçando os coelhos deste. Faça seu trabalho. Deixe os mentirosos e suas mentiras, deixe os sectários discutirem, deixe os críticos maldizerem, deixe os inimigos acusarem, deixe o diabo fazer o pior; mas cuide para que nada o impeça de cumprir com alegria o trabalho que Deus lhe incumbiu.

Ele não o mandou ser admirado ou estimado, e nunca ordenou que defendesse seu caráter. Ele não o posicionou para contradizer as falsidades (acerca de você mesmo) que os servos de Satanás ou de Deus talvez comecem a espalhar, nem para investigar cada rumor que ameace sua reputação. Se você agir assim, não obterá resultados satisfatórios; estará trabalhando para si mesmo, não para o Senhor.
Mantenha-se no trabalho do Mestre. Que seu alvo seja fixo como uma estrela. Você pode ser assaltado, injuriado, insultado, caluniado, ferido e rejeitado, incompreendido ou acusado de motivações impuras; bem como afrontado pelos inimigos, traído pelos amigos, desprezado e rejeitado pelos homens. Mas tenha determinação e zelo inabalável, a fim de perseguir o grande propósito e objetivo de sua existência, até que finalmente possa dizer: “Completei o trabalho que tu me deste”
John McArthur Jr.

quinta-feira, 4 de junho de 2009

C.S.Lewis e o Seu Problema Com o Sofrimento

O texto abaixo são várias partes do diário de Lewis (1898-1963) onde ele registrou, aos 62 anos de idade, os seus pensamentos e sentimentos sobre a dor de viver em luto por causa da morte de sua amada esposa Helen Joy Gresham, a quem ele se refere como "H". Um detalhe importante é que 20 anos antes desse fato, o maior apologeta cristão do século 20 havia escrito uma de suas obras-primas,"O Problema do Sofrimento", tratando sobre a existência de um Deus bondoso e de um mundo caótico e surdo a voz desse Deus. Aqui, porém, Lewis não escreve sobre o sofrimento como uma obra teológica e filosófica, mas o enfrenta perto de mais, com seus medos, fortes lembranças, suas dúvidas e solidão, com a sua fé aparentemente abalada. Há momentos que ele mais se parece com um filósofo ateu existencialista do que com o famoso professor de literatura medieval de Oxford e teólogo anglicano. Talvez acharemos estranho estas suas palavras, mas, respeitando as devidas proporções, em alguns aspectos este texto se parece e muito com alguns dos salmos das Escrituras.
"Ninguém me disse que o luto se parecia tanto com o medo... E ninguém nunca me falou sobre a preguiça do luto... Onde está Deus? Esse é um dos sintomas mais inquietantes. Quando você está feliz, muito feliz, não faz nenhuma idéia de vir a necessitar dEle, tão feliz, que se vê tentado a sentir suas reivindicações como uma interrupção; se se lembrar e voltar a Ele com gratidão e louvor você será - ou assim parece - recebido de braços abertos. Mas, volte-se para Ele, quando estiver em grande necessidade, quando toda outra forma de amparo for inútil, e o que você encontrará? Uma porta fechada na sua cara, ao som do ferrolho sendo passado duas vezes do lado de dentro. Depois disso, silêncio. Bem que você poderia dar as costas e ir embora. Quanto mais espera, mais enfático o silêncio se torna. Não há luzes nas janelas. Talvez seja uma casa vazia. Será que, algum dia, chegou a ser habitada? Assim pareceu, certa vez. E essa semelhança era tão forte quanto agora. O que isso pode significar? Porque em tempos prósperos Ele mais parece um comandante e em tempos conturbados Sua ajuda é tão ausente?

Tentei expor alguns desses pensamentos a C.{um amigo de Lewis} nesta tarde. Ele me lembrou que o mesmo parece ter acontecido com Cristo: "Porque me abandonaste?". Eu sei. Mas isso torna as coisas mais fáceis de serem entendidas? Não que eu esteja (suponho) correndo o risco de deixar de acreditar em Deus. O perigo real é o de vir a acreditar em coisas tão horríveis sobre Ele. A conclusão a que eu tenho horror de chegar não é "então, apesar de tudo, não existe Deus nenhum", mas "então, é assim que Deus é realmente. Não se iluda"... Evidentemente, é bem fácil afirmar que Deus parece ausente em nossas maiores necessidades, porque Ele está ausente - não-existente. No entanto porque Ele parece tão presente quando, para dizer com franqueza, não solicitamos Sua presença?

...Depois da morte de um amigo, anos atrás, durante algum tempo tive a mais vívida sensação de certeza da continuidade de sua vida; até mesmo do enaltecimento de sua vida. Tenho rogado que me seja dada até mesmo uma centésima parte da mesma certeza a respeito de H. Não há resposta alguma. Só a porta fechada, a cortina de ferro, o vácuo, o nada. "Pois todo o que pede..." - não recebe. Fui um louco em pedir. Por ora, mesmo que essa segurança sobreviesse, eu não lhe deveria dar crédito, antes deveria julgá-la uma auto-hipnose motivada por minhas próprias orações...

E essa separação {ele se refere a morte}, suponho está à espera de todos. Tenho pensado em H. e em mim mesmo e em como fomos injustamente separados um do outro. Presumo que todos os apaixonados o são... então, que fim concebível poderia haver em separar os antigos? Será que Deus é um palhaço, que de súbito lhe retira a tigela de sopa a fim de, no momento seguinte, substituí-la por outra com a mesma sopa? Nem a natureza parece semelhante palhaço. Ela jamais toca duas vezes a mesma música exatamente igual... Ó, Deus, Deus porque tiveste tanto trabalho de obrigar esta criatura a sair de sua concha se ela agora está condenada a se arrastar de volta - a ser novamente levada para lá?...

Se a bondade de Deus não é coerente com o ato de nos ferir, então, ou Deus não é bom, ou não há Deus algum: pois na única vida que conhecemos Ele nos fere de um modo tal, além de nossos piores pavores, acima de tudo o que podemos imaginar. Se essa bondade for condizente com o ato de nos ferir, então Ele pode muito bem fazer isso depois da morte de maneira tão intolerável quanto antes dela. Às vezes é difícil não dizer: "Deus, perdoe a Deus". Às vezes, é difícil dizer tanto; mas, se nossa fé for verdadeira, ele não fez isso. Ele crucificou-se...

Mais cedo ou mais tarde, devo encarar a questão de frente. Que razão temos nós, com exceção de nossos próprios desejos desesperados, de acreditar que Deus seja "bom" (de qualquer ângulo por nós estabelecido)? Todas as evidências prima facie (à primeira vista) não sugeririam exatamente o contrário? O que temos para contrapor a elas? Contrapomos Cristo a elas; mas como, se ele foi mal compreendido? Suas últimas palavras podem ter um sentido perfeitamente claro. Ele descobriu que o Ser que ele chamava Pai era horrivelmente, infinitamente distinto do que Ele havia suposto. A armadilha, por tanto tempo preparada, de maneira tão meticulosa e com iscas tão sutis, fora por fim armada sobre a cruz. A artimanha desprezível triunfara...

Por que ocupo minha mente com tamanhas imundícies e disparates? Será que tenho esperanças de que, se o sentimento se disfarçar de pensamento, sentirei menos? Não seriam todos estes apontamentos agonias mentais insensatas de um homem que não aceita o fato de não haver nada que possamos fazer com o sofrimento, exceto padecê-lo? Quem ainda crê que haja algum expediente (ah, se esse homem pudesse encontrá-lo...) capaz de fazer a dor não ser dor? De fato, não importa se você agarra os braços da cadeira do dentista nem se suas mãos repousam no colo. A broca continua perfurando...

Bem, faça sua escolha. As torturas ocorrem. Se elas são desnecessárias, então não há Deus nenhum, tampouco um Deus mau. Se há um Deus bom, então essas torturas são necessárias. Pois nenhum Ser que fosse bom, mesmo de maneira comedida, provavelmente seria capaz de as infrigir ou de as permitir caso elas não fossem necessárias. Seja o que for, não há como escapar. O que as pessoas querem dizer quando afirmam: "Não tenho medo de Deus porque sei que Ele é bom."? Será que nunca foram ao dentista?...

Aos poucos passei a sentir que a porta não está mais fechada e aferrolhada. Será que foi minha necessidade frenética que a fechou na minha cara? Quando nada há em sua alma exceto um grito de socorro talvez seja o exato momento em que Deus não o pode atender: você é como o homem que se afoga e que não pode ser ajudado por tanto se debater. É possível que seus gritos repetidos o deixem surdo à voz que você esperava ouvir. Entretanto " '...batam, e a porta lhes será aberta' ". Até que ponto "bater" significa esmurrar e chutar a porta como um maníaco?...

Revendo o que escrevi, percebo que só há bem pouco tempo estive muito voltado para minhas lembranças de H. e para como elas poderiam tornar-se falsas. Por alguma razão - o bom-senso misericordioso de Deus é o único em que posso pensar - deixei de aborrecer-me com isso...Deus certamente não estava fazendo uma experiência com a minha fé nem com meu amor para provar sua qualidade. Ele já os conhecia muito bem. Eu é que não. Nesse julgamento, ele nos faz ocupar o banco dos réus, o banco das testemunhas e o assento do juiz de uma só vez. Ele sempre soube que meu templo era um castelo de cartas. A única forma de fazer-me compreender o fato foi colocá-lo abaixo.

...No entanto há os dois enormes ganhos - agora, eu mesmo sei o bastante para chamá-los de "duradouros". Voltada para Deus, minha mente não encontra mais a porta fechada; voltada para H., não encontra mais aquele vácuo - tampouco aquela confusão acerca da imagem mental que tenho dela. Meus rabiscos mostram algo do processo, mas não tanto quanto eu esperava. Talvez ambas as mudanças não fossem, de fato, passíveis de observação. Não houve nenhuma transição súbita, surpreendente e de caráter emocional. Como o aquecimento de um cômodo ou o raiar do dia. Quando você se dá conta deles pela primeira vez, eles já estão em andamento há algum tempo..."



Clive Staples Lewis

quarta-feira, 3 de junho de 2009

"Espiritismo e Livre-Arbítrio"

"Tudo o que o Senhor deseja ele o faz, no céu e na terra, nos mares e em todos os abismos" Sl 135:6



Na doutrina espírita, o livre-arbítrio ocupa uma posição fundamental. No Livro dos Espíritos Allan Kardec escreveu:

"Sem o livre-arbitrio, o homem não teria nem culpa por praticar o mal, nem mérito em praticar o bem, e isto a tal ponto está reconhecido que, no mundo, a censura ou o elogio são feitos à intenção, isto é, à vontade. Ora, quem diz vontade diz liberdade".

O sistema espírita se baseia numa espécie de contabilidade, onde a prática do bem gera créditos e do mal são lançadas como débito e o espírito evolui conforme o saldo for positivo. Num sistema assim, o livre-arbítrio é uma condição sine qua non para atribuição de culpa e mérito, e se este não existir todo o edifício do kardecismo vem abaixo.

Da mesma forma que advoga o livre-arbítrio, o espiritismo posiciona-se contrário à predeterminação dos acontecimentos. Na mesmo obra citada, à pergunta:

"Haverá fatalidade nos acontecimentos da vida, conforme o sentido que se dá a essa palavra, ou seja, todos os acontecimentos são predeterminados? Nesse caso, como fica o livre-arbítrio?"

Allan Kardec responde:

"A fatalidade existe apenas na escolha que o Espírito faz ao encarnar e suportar esta ou aquela prova. E da escolha resulta uma espécie de destino, que é a própria conseqüência da posição que ele próprio escolheu e em que se acha. Falo das provas de natureza física, porque, quanto às de natureza moral e às tentações, o espírito, ao conservar seu livre-arbítrio quanto ao bem e ao mal, é sempre senhor para ceder ou resistir ...”.

E como o espiritismo concilia a prescidência divina com o livre-arbítrio? León Dennis responde nas seguintes palavras:

"Deus, cuja ciência infinita abrange todas as coisas, conhece a natureza de cada homem e as impulsões, as tendências, de acordo com as quais poderá determinar-se. Nós mesmos, conhecendo o caráter de uma pessoa, poderíamos facilmente prever o sentido em que, numa dada circunstância, ela decidirá, quer segundo o interesse, quer segundo o dever. Uma resolução não pode nascer de nada. Está forçosamente ligada a uma série de causas e efeitos anteriores de que deriva e que a explicam. Deus, conhecendo cada alma em suas menores particularidades, pode, pois, rigorosamente, deduzir, com certeza, do conhecimento que tem dessa atina e das condições em que ela é chamada a agir, as determinações que, livremente, ela tomará"

Pelas citações acima, é possível perceber como a visão espírita do livre-arbítrio é quase que indistinguível da idéia popular no meio evangélico de liberdade humana.



Fonte: http://cincosolas.blogspot.com (precisamente encontrado aqui)
Autor: Clóvis